No Brasil, 89% da população se automedica. Os índices preocupantes são do levantamento de 2022 realizado pelo Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico (ICTQ). Em 2019, uma pesquisa do Conselho Federal de Farmácia (CFF) e do Instituto Datafolha já mostrava um cenário grave sobre a prática no país: 77% dos brasileiros entrevistados afirmaram usar remédios por conta própria, sem prescrição.
De modo geral, a automedicação é o ato de tomar medicamentos sem orientação médica. De acordo com um informativo da Biblioteca Virtual em Saúde do Ministério da Saúde (BVS), essa prática costuma ser vista como uma solução para o alívio imediato de determinados sintomas. No entanto, o consumo de remédios não é simples e o hábito sem indicação pode causar uma série de consequências prejudiciais à saúde.
Presidente da Associação Paulista de Medicina (APM) e formado em Medicina pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, Antonio José Gonçalves fala que a automedicação pode ser incentivada por informações de familiares, amigos, curiosos ou, até mesmo, por pesquisas na internet.
“O hábito de buscar informações sobre tratamento de doenças na internet tem aumentado a automedicação. O acesso a conteúdos que não são avaliados por nenhuma instituição científica causa esse crescimento. Além disso, muitos resultados ‘espetaculares’ [de medicamentos] nem sempre são os que a ciência recomenda”, defende.
Um estudo publicado na Scientific Electronic Library Online (SciELO) destacou que esse ato também pode ser influenciado por dificuldades de acesso aos serviços de saúde, além da demora e baixa qualidade no atendimento tanto em unidades públicas quanto privadas. Outros fatores descritos no artigo englobam as propagandas de medicamentos livre de prescrição, a forte presença da ‘farmacinha caseira’ e a crença de que determinados remédios resolvem tudo.
Antonio exemplifica casos em que pacientes mudam a dosagem de um medicamento sem orientação, baseados apenas na sua percepção de que o remédio não está fazendo bem ou de que a dose não está adequada.
Riscos da automedicação
Conforme o levantamento do ICTQ citado acima, os analgésicos são os mais usados por conta própria. Em segundo lugar estão os antigripais e, em terceiro, os relaxantes musculares. Um artigo de 2019 na Revista JRG de Estudos Acadêmicos destacou que a ingestão de analgésico sem orientação tem ocasionado um crescimento da dependência desse remédio.
O informativo da BVS pontuou que todo medicamento possui possíveis riscos por conta de seus efeitos colaterais. Quem possui o hábito de se automedicar pode estar exposto a perigos como intoxicação e resistência a medicamentos. Além disso, a publicação ressaltou que o uso incorreto de remédios é capaz de causar reações alérgicas e levar a quadros fatais.
Outro artigo publicado na plataforma National Library of Medicine citou alguns riscos das práticas de automedicação, como: interações medicamentosas perigosas, dosagem incorreta, mascaramento de doenças graves, entre outros.
Influência da automedicação em outros medicamentos
Algumas interações medicamentosas podem potencializar ou anular o efeito de um remédio. “Isso acontece porque muitas medicações atuam em receptores celulares e esses receptores, às vezes, são voltados para um único medicamento”, explica Antonio.
Com isso, ele cita alguns exemplos de combinações entre medicamentos capazes de causar problemas sérios para a saúde. “O anticoagulante varfarina associado com o amiodarona, que é um antiarrítmico, pode aumentar o efeito do anticoagulante e causar hemorragias”, diz. Um anticoagulante serve para evitar a formação de coágulos no sangue, enquanto o medicamento amiodarona auxilia na manutenção do batimento cardíaco.
O presidente da APM também comenta que se a vitamina K interagir com o medicamento varfarina, essa vitamina pode estimular a coagulação, diminuindo o efeito do anticoagulante.
Outra situação é quando pacientes que usam benzodiazepínicos para dormir passam a usar opioides, devido a alguma condição dolorosa. “Isso precisa ser feito com muito critério, porque o benzodiazepínico pode potencializar o efeito do opioide, causando sonolência, confusão mental e, às vezes, chegar até o coma, dependendo da dose”, destaca. Vale citar que os benzodiazepínicos atuam como tranquilizantes e sedativos, enquanto os opioides possuem uma ação analgésica – ou seja, aliviam dores.
Os fitoterápicos também não fogem da necessidade de serem usados com orientação médica. Conforme Antonio, o uso inadequado de alguns podem aumentar sangramentos, por exemplo.
Já algumas ervas podem causar um ‘efeito serotoninérgico’ no organismo – ou seja, o aumento da serotonina, conhecida como ‘hormônio da felicidade’, em níveis tóxicos. “Nesse caso, essa intoxicação é capaz de provocar desde tontura e sonolência até convulsões”, aponta.
O informativo da BVS citou os antibióticos. O seu uso precisa ser cuidadoso, pois o abuso desses produtos pode aumentar a resistência de microrganismos, comprometendo a eficácia dos tratamentos.
Existe uma maneira adequada para uso de medicamentos para dor de cabeça ou outras dores no corpo?
Ao sentir uma dor de cabeça em algum dia no meio da semana, muitas pessoas recorrem a um medicamento para aliviar o incômodo ao invés de procurar um hospital de imediato.
Para fazer um uso adequado desses medicamentos, Antonio orienta: “O próprio farmacêutico indica e explica a dosagem”. Mas quando é preciso buscar um médico? De acordo com o presidente da Associação Paulista de Medicina (APM), a procura por um profissional de saúde é necessária se a dor aumentar.
Quando é preciso buscar auxílio médico por conta da automedicação?
Os pacientes que apresentarem sintomas causados pela automedicação devem procurar um serviço de emergência (Foto: Freepik).
Falta de ar, dor no peito, tontura, confusão mental, vômitos persistentes, diarreia e outros sinais graves: se esses sintomas relacionados à automedicação se manifestarem, é preciso procurar um serviço de saúde de emergência.
“É crucial levar a caixa do medicamento usado, para o profissional de saúde fazer uma avaliação melhor sobre a situação e tratar o problema”, diz Antonio.
Automedicação: como prevenir os efeitos prejudiciais à saúde?
Quando se trata da prevenção da automedicação, a orientação é simples: não use remédios por conta própria, como ressalta Antonio. “Procure sempre um auxílio médico, para o paciente ser medicado com segurança e, assim, atingir o objetivo de controle ou cura de uma doença”, orienta. Isso também evita que um medicamento prejudique diferentes tipos de tratamento.
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