ALERGIA ALIMENTAR: saiba mais

ALERGIA ALIMENTAR: saiba mais

Detalhamos tudo o quê você precisa saber sobre as AAs e entrevistamos uma das fundadoras da Alergia Alimentar Brasil, grupo de apoio ao tema

No Brasil, estima-se que 6% das crianças e 3,5 % dos adultos têm alguma alergia alimentar. Os primeiros sintomas podem aparecer nos primeiros meses após o nascimento e acompanhar durante toda a vida da pessoa ou, ainda, surgir somente quando adulto.

Mas você sabe o que é Alergia Alimentar (AA)? A doença é uma resposta imunológica exagerada do organismo a determinadas proteínas presentes nos alimentos. Estima-se que mais de 170 alimentos são considerados potencialmente alergênicos, mas 90% das reações são causadas por leite, soja, ovo, trigo, amendoim, castanhas em geral, peixes e crustáceos. No Brasil, encontramos ainda casos envolvendo milho, banana e mandioca.

Segunda a médica e especialista em alergia alimentar pela Mount Sinai School of Medicine (EUA), Renata Cocco, crianças com histórico familiar de alergias apresentam maior predisposição para as reações alérgicas, mas alerta que alguns fatores ambientais podem facilitar o seu desenvolvimento nos pequenos, mesmo sem histórico. A boa notícia é que, geralmente, as alergias a leite, ovo, soja e trigo são superadas até a segunda década de vida. “Outros alimentos, no entanto, como amendoim, castanhas, peixes e frutos do mar não são superados”, alerta a alergista e imulogista.

Quando a alergia alimentar acomete bebês, o médico deverá onalisar o consumo do alérgeno pela mãe e avaliar a necessidade de retirar ou não sua dieta. Para isso, observará se o bebê apresenta reações pelo leite materno ou pelo contato direto com o alimento alergênico. Em ambos os casos, deve se manter a amamentação, que tem diversos benefícios para a mãe e para o bebê.

Conheça os sintomas

A AA tem apresentação clínica muito variável, e pode surgir em várias partes do corpo. As reações podem ser leves, com simples coceira nos lábios, até mais graves, incluindo comprometimento de vários órgãos e potencial risco de óbito. Confira algumas manifestações.

  • Pele – podem surgir urticárias, dermatites, inchaços, coceira e eczemas;
  • Sistema gastrointestinal – o alergico desevolve vômito, diarreia com ou sem sangue, refluxo, azia, constipação e dor abdominal;
  • Sistema respiratório – apresenta falta de ar, tosse, broncoespasmos e rouquidão;
  • Sistema cardiovascular – sinais de palidez, lábios roxos, tontura, pulso fraco e desmaio.

Conheça os tipos

Outra informação importante é que as alergias são classificadas em mediadas, não mediadas e mistas. Para cada tipo e características, existe um tratamento e modo de lidar com eventuais reações. Vamos entendê-las?

  • Alergia mediada por IgE: são reações alérgicas imediatas. O sistema imune produz anticorpos chamados imunoglobulina E (IgE). Existe um tipo de IgE para cada tipo de proteína dos alimentos.. Quando o IgE entra em contato com o alimento alergênico específico para o qual foi produzido, causa as reações imediatas, que podem se manifestar no sistema gastrointestinal, respiratório e/ou na pele. As reações surgemem até duas horas após o contato com o alergênico, e podem ser leves, moderadas ou graves (com risco de morte), quando ocorre a anafilaxia..
  • Alergia não mediada por IgE: são as reações que costumam demorar mais para aparecer: algumas horas ou até dias após a ingestão do alimento alergênico. Não há uma imunoglobulina específica; são outros agentes do nosso corpo que reagem aos alimentos (as células). A maioria dos sintomas desse tipo de alergia envolve o trato gastrointestinal (esôfago, estômago e intestino), com sintomas como diarreia com ou sem sangue visível nas fezes, refluxo (aparente ou oculto), baixo ganho de peso entre outros.
  • Mista: o tempo de aparecimento dos sintomas pode variar muito, (imediatos ou até dias para se manifestar). Os sintomas são decorrentes de uma mistura de ações de várias células, podendo ter a participação dos anticorpos IgE. Estão nesse grupo, a dermatite atópica e a esofagite eosinofílica.

Diagnósticos e tratamentos

Se você desconfia de que determinado alimento está te fazendo mal, a primeira coisa que você precisa fazer é procurar um profissional de saúde. Não suspenda o consumo de nenhum alimento sem a orientação do profissional da área. Somente o médico pode diagnosticar a alergia alimentar com precisão (através de exame físico, testes de retirada e retorno do alimento suspeito e exames complementares, se necessários) e indicar tratamento (dieta isenta do alimento e medicações para o caso de reações em alguns casos).

Após o diagnóstico de alergia alimentar, é importante entender os impactos no dia a dia do alérgico e de sua família. Além de seguir as recomendações do profissional de saúde em relação à dieta e à prescrição de medicamentos, é muito importante que se crie o hábito da leitura atenta de rótulos a cada compra, cuidado no preparo das refeições, atenção na ida a restaurante e lanchonetes entre outras praticas. No caso do diagnóstico confirmado, o único tratamento é a exclusão do alimento que causa alergia. Para produtos industrializados é importante ler os alertas presentes nos rótulos, que obrigatoriamente precisam apresentar as informações de: CONTÉM (nome do alérgeno) ou PODE CONTER (nome do alérgeno).

Para a maioria dos alimentos que causam alergia alimentar em crianças existe a tendência de que haja a aquisição de tolerância espontânea ao alimento. Isso é, passado um tempo (que varia dependendo da pessoa e do tipo de alergia), a pessoa pode adquirir tolerância oral, quando ela deixa de reagir ao alimento que tinha reações. Por isso, é importante a realização periódica do teste de provocação oral.

Como nem sempre a tolerância oral chega naturalmente, em alguns casos específicos (alergias mediadas graves e após os 5 anos), o médico poderá sugerir tratamento chamado de dessensibilização (imunoterapia oral), seja por meio da oferta de pequenas doses do alimento, seja pelo consumo de alimentos preparados de uma maneira especial (baked).

O tratamento pode ser indicado na forma conhecida como protocolo baked, que é possível de ser utilizada no caso de alguns alimentos, como leite e ovo, que contêm proteínas que são “quebradas” (desnaturadas) com o calor. A receita é preparada em conjunto com outros ingredientes e assada, respeitando criteriosos padrões de preparo. Apenas o médico pode avaliar como e quando esse tipo de introdução pode ser feita, para que não haja reações alérgicas indesejadas.

Atualmente, os brasileiros que possuem alergias alimentares podem contar com iniciativas não governamentais como a Alergia Alimentar Brasil que desenvolve projetos que buscam levar informação e movimentos que confiram maior segurança e inclusão das pessoas que convivem com alergia alimentar.

 Saiba mais um pouco com nossa entrevistada

Entrevistamos Fernanda Mainier Hack, uma das fundadoras da Alergia Alimentar Brasil, grupo de conscientização sobre o tema, que trabalha com fámilias que tratam da doença, e com o compartilhamento de informações que esclareçam sobre Alergias Alimentares no país. Fernanda, além das ações de conscientização do grupo, é advogada e procuradora do Estado do Rio de Janeiro.

  • Conte-nos um pouco sobre o trabalho que Alergia Alimentar Brasil desenvolve.

Alergia Alimentar Brasil é uma iniciativa de mulheres que convivem com o tema da alergia alimentar em suas famílias e que trabalham para garantir mais informação, conscientização da sociedade e inclusão, e movimentos que ampliem a segurança e melhorem a qualidade de vida de quem tem alergia alimentar. Este grupo é formado pela mesma equipe que conduz o movimento Põe no Rótulo, criado em 2014 com o principal objetivo de mostrar para a sociedade a importância da clareza da presença de ingredientes alergênicos nos rótulos de alimento e bebidas industrializados e pressionar o governo, em especial a Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa, para que os rótulos fossem mais claros com relação aos seus ingredientes. Além de trabalhar por políticas públicas, nos dedicamos a apoiar as famílias que convivem com alergia alimentar de diversas formas, em especial, com a produção de material informativo e ferramentas como o Alerta Alergia, que auxilia na escolha de receitas seguras para alérgicos.

  • Quais as últimas novidades científicas sobre alergias alimentares?

Acompanhamos diversos eventos científicos nacionais e internacionais e temos percebido cada vez mais ênfase em dois aspectos importantes: (i) necessidade de acompanhamento multidisciplinar dos pacientes com alergia alimentar (além do médico, nutricionista, fonoaudiólogo, psicólogo etc) e (ii) os impactos psicológicos da alergia alimentar.

Nesse sentido temos muito orgulho ter o Brasil inserido em uma pesquisa global sobre os impactos psicológicos sobre alergia alimentar.

  • Existem políticas públicas para população alérgica?

Podemos elencar algumas importantes políticas públicas como:

  • Rotulagem Obrigatória: a RDC 26/15 (Anvisa) é a legislação que determina o destaque obrigatório dos principais ingredientes que causam alergia (leite, ovo, peixe, crustáceo, trigo, soja, amendoim, castanhas, amêndoas, avelãs, nozes, macadamias, pistaches, pinolis e latex) nos alimentos e bebidas industrializados. Com isso ficou determindo que os rótulos apresentem informações sobre alergênicos, permitindo ao consumidor identificar, após a lista de ingredientes, frases de alerta de presença (ou possível presença) de alergênicos.
  • Cardápio adaptado nas escolas da educação básica: a Lei n° 11.947/2009, que institui o PNAE – Programa Nacional de Alimentação Escolar obriga a disponibilidade de cardápio adaptado a quem tem necessidades alimentares especiais.
  • Ações contra discriminação aos estudantes com doenças crônicas: em alguns estados e municípios como a Lei nº 16.925/2019, do Estado de São Paulo veda a discriminação aos estudantes com doenças crônicas, entre elas, a alergia alimentar.
  • Como proceder com o fabricante, se algum consumidor alérgico passar mal consumindo um produto industrializado destinado para alérgicos?

Se o alerta para alérgicos estiver incorreto ou não estiver presente e/ou em caso de reação alérgica é possível denunciar à Ouvidoria da Anvisa ou a outras instituições, como as Vigilâncias Sanitárias Municipal ou Estadual, Procon, Ministério Público, IDEC e Proteste.

  • Qual a tendência do mercado para novos produtos destinados para o publico alérgico?

Temos percebido o aumento de opções de produtos para a população que convive com alergia alimentar: substitutos de ovos, bebidas vegetais, chocolates veganos, além do surgimento de empresas que enfocam a sua produção nesse nicho, ressaltando que a experiência de leitura atenta e constante de rótulos de alimentos em razão da alergia alimentar e o mergulho profundo na arte de adaptar receitas leva muitos consumidores a serem mais críticos em relação à composição dos produtos. Assim, o lançamento de produtos que alcança a comunidade de alérgicos é bem-vinda, tendo em vista o potencial de inclusão, mas precisa levar em conta esse perfil mais consciente em relação à alimentação.

Na edição de agosto da PROTESTE trazemos uma matéria sobre alergias na pele. Se você ainda não é associado PROTESTE, associe-se, e confira mais informações.

 

Manuela Azevedo